quarta-feira, 22 de julho de 2009

OS RISCOS DA IMPORTAÇÃO

Claro que é muito saudável a permanente troca de mercadorias e idéias entre os povos. Assim como a expectativa de que, agindo com total liberdade na busca de atender seus interesses particulares, cada um acaba contribuindo para o bem estar coletivo. Mas, envolve risco.
Veja-se, por exemplo, o acontecido quando alguém, na legítima aspiração de enriquecer mas infenso a criar um caminho próprio seja por questões culturais ou pessoais, resolveu importar pneus usados. Quase viramos escoadouro mundial desse descarte incômodo.
Mais recentemente, outro brasileiro resolveu importar lixo para reciclagem. Quase viramos o aterro sanitário da Inglaterra.
Contudo, sem dúvida, o que envolve maior riscos é a importação de bandeiras. Na intenção (também legítima, claro) de crescer politicamente, candidatar-se e angariar votos, mas não possuindo criatividade própria para suscitar uma causa tupiniquim, correm ao mercado internacional de idéias políticas em busca de uma bandeira. E o valor nunca é dado ao que a bandeira agasalha em termos de conteúdo, e, sim, ao seu charme mobilizador.
Importa-se, dos Estados Unidos -- um país diferente do nosso na política, na economia, na educação e na questão racial --, a tal "discriminação positiva" e as cotas, e ganharemos como subproduto um apartheid, seja com qual sinal matemático for.
Na década de 70 chegam ao poder na Itália os partidos de esquerda portando, entre outras, a bandeira da luta antimanicomial. Dramáticos como são os italianos, saíram a derrubar a marretas os muros dos hospícios, libertando alguns, mas lançando outros ao abandono das ruas ou à desorganização de famílias. Na década de 80, toda a sociedade recuou e restaurou a instituição. Evidentemente corrigida nas piores falhas, o que seria o correto desde o começo. E, finalmente, na década de 90 as esquerdas brasileiras, carentes de causas ou de sensibilidade para descobri-las em nossas necessidades, importaram essa bandeira rota e abandonada pelas esquerdas italianas.
O mais trágico nessas causas importadas é a carência de senso crítico que se desenvolveria naturalmente se a idéia fosse gestada localmente ou decorresse de necessidades nacionais. Sem essa massa crítica, elas são assimiladas apaixonada e irracionalmente pelos que se julgam por elas beneficiados, e qualquer um que tente argumentar em sentido contrário torna-se um potencial inimigo. Assim, quem argumenta contra as cotas é acusado de racista. Quem, por labutar na área, sabe que existem muitas pessoas necessitadas de períodos de internação -- seja para defendê-la dos outros, os outros dela, ou ela de si mesma; ou, ainda, por causa da mania de nossos políticos de começarem as reformas pelo telhado, criando leis que obrigam coisas para as quais ainda não foram criadas as condições materiais --, e argumenta contra o delenda internamento, é acusado de estar defendendo seus próprios interesses. Aliás, em muitos casos, se fossem antes criadas as condições materiais, a lei se tornaria desnecessária, e com ela a bandeira, e com esta os votos.
Talvez mais trágico ainda do que isso tudo, seja a presteza com que os poderes do Estado adotam tais bandeiras importadas, de olho na diminuição das despesas públicas, o que permite sobrar numerário que garanta a manutenção do maior, mais caro e mais inoperante contingente de servidores públicos que a história humana jamais viu. Assim, ao invés de investir pesado na educação de base, cria-se uma lei de cotas como paliativo. Ao invés de melhorar a saúde pública e corrigir as gritantes aberrações hospitalares, extingue-se os hospitais psiquiátricos. Em lugar de uma política eficiente na proteção da velhice, joga-se o problema para o contribuinte, obrigando um cidadão a conviver com quem nada fez durante a vida para lhe conquistar o afeto ou o respeito, exigindo-lhe uma responsabilidade que seria meritória se assumida voluntariamente, mas torna-se uma violência à liberdade individual quando imposta.
Enfim, assim como há uma alfândega que protege o erário da sonegação fiscal, deveríamos desenvolver uma barreira crítica que nos protegesse da importação de idéias e soluções.

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